Maniçoba, o prato tradicional do Norte

Desvendamos o prato que demora sete dias para ficar pronto e leva de folhas de mandioca a bucho de boi

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Sobre a Receita
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A Amazônia é aquela face do planeta bem ímpar e que dispensa explicações. A cozinha local também segue pelo mesmo caminho. Dentro desse universo, a maniçoba é um dos mais representativos elementos, sendo um dos ícones da gastronomia paraense, com raízes na culinária indígena, enriquecida com ingredientes dos colonizadores.

As peculiaridades começam por sua matéria-prima principal: a maniva, que são as folhas da mandioca moídas e que passam por cozimento durante sete dias! Processo obrigatório e todo cheio de minúcias. “Adiciona-se apenas água nos dois primeiros dias. Nos seguintes, acrescentam-se os embutidos e os defumados de carne bovina ou suína, como charque, lombo defumado, paio, linguiça, mocotó e bucho de boi; orelha, costela, pé, lombo e rabo de porco”, conta o jornalista Fernando Jares Martins, um dos grandes pesquisadores da cultura e da gastronomia do Pará. “Pela sua forma de preparo, é sempre feita em grandes quantidades, para celebrar e compartilhar, o que vem a ser uma característica da cozinha paraense. O cozimento longo é para eliminar o ácido cianídrico, dito fatal, e ganhar bem o gosto dos demais ingredientes”, alerta ele, que é autor de livros como “Gastronomia do Pará: o Sabor do Brasil” (2014), em parceria com o professor Álvaro Negrão do Espírito Santo.

Trata-se de uma verdadeira “feijoada sem feijão”, como bem definiu tempos atrás Anna Maria Martins (1925-2007), grande cozinheira de Belém, idealizadora do Lá em Casa, até hoje um dos melhores restaurantes da cidade (é de autoria dela a receita que ilustra esta reportagem, gentilmente cedida pelo Instituto Paulo Martins).

Vale ressaltar que a maniçoba não é de consumo trivial como a feijoada, que figura como o prato das quartas-feiras em São Paulo e do sábado no Rio de Janeiro. Ela é consumida pelos paraenses em dias de festa, como casamento, aniversário e festa de 15 anos. E especialmente no grande almoço no Dia do Círio – o segundo domingo de outubro, quando disputa os olfatos com o pato no tucupi como dupla onipresente nas mesas paraenses nesse dia.

“Embora a maniçoba possa ser encontrada em outros Estados da Amazônia, essa importância grande só existe no Pará. No Amazonas, onde não é comum, existe até o registro de um prato feito com maniva e peixe por indígenas de duas etnias no Alto Rio Negro. Mas em Manaus, quando encontrada, segue a receita paraense”, complementa Fernando.

Ingredientes

  • 2 Paneiros de folhas de mandioca (maniva);
  • 2 Kg de toucinho branco;
  • 2 Kg de toucinho defumado;
  • 2 Kg de pé de porco salgado;
  • 2 Kg de orelha de porco salgada;
  • 2 Kg de língua de porco salgada;
  • 2 Kg de rabo de porco salgado;
  • 2 Kg de lombo de porco salgado;
  • 2 Kg de costela de porco salgada;
  • 1 1/2 Kg de paio;
  • 1 1/2 Kg de chouriço;
  • 1 1/2 Kg de linguiça de porco;
  • 4 Kg de bucho de boi;
  • 4 Kg de charque

Modo de Preparo

Pique as folhas de mandioca (maniva) sem os talos e moa muito bem em uma máquina de moer carne, até dar 6 quilos.

Num panelão, com bastante água, leve a maniva moída ao fogo brando e deixe ferver durante 72 horas. Mexa de vez em quando, dando pelo menos três boas mexidas por período: manhã, tarde e noite; isto é feito para que as folhas não grudem na panela. Coloque sempre água, pois a massa não pode ficar seca. Quando for dormir, complete a água de novo e deixe o fogo mais baixo possível.

Passada as 72 horas, acrescente o toucinho branco (sem cortar) e o toucinho defumado (também inteiro). Deixe ferver por mais 24 horas, sempre em fogo brando e completando a água e dando no mínimo três boas mexidas por período.

Com a maniva continuando a ferver na tarde do quarto dia, à parte, ponha as carnes salgadas e o charque de molho para tirar o excesso de sal. Ficam de fora apenas o paio, o chouriço, a linguiça e o bucho de boi.

No quinto dia, corte em pedaços do tamanho de servir o bucho de boi e escalde muito bem para tirar todo o cheiro. Corte também em tamanho de servir as carnes salgadas, lave bem e afervente, junte tudo e ponha no panelão em que a maniva continua fervendo por mais 48 horas, desligando o fogo quando for dormir.

No sexto dia, cortar em rodelas o paio, o chouriço e a linguiça e por para ferver.

No sétimo dia, a maniçoba já está pronta e fica como se fosse uma feijoada.

Sirva com arroz branco, farinha d’água de mandioca e uma pimenta de cheiro.

Dica: a cor da maniva que, no início do cozimento, é verde bem vivo vai se transformando, até ficar um verde muito escuro quase preto.